quinta-feira, 29 de abril de 2010

Gratidão, um poema

"DE Viva Voz" , Antologia poesia portuguesa contemporânea

GRATIDÃO QIE NEM SABE
A QUEM DEVE SER GRATA

Não, Não o faço por tristeza
nem superstição.

Cada noite
assinalo na parede do tempo.

Presidiário
que não deseja o último dia.

Apenas por te ouvir e amar,
pura volúpia, gratidão de ser.

Gratidão de ser
por estes anos
e partículas restantes.

Pela amizade,
que chega a confundir o amor.

Pela bondade,
que torna a solidão desvalida.

Pela hombridade,
à altura do céu.

Pela beleza,
que só à santidade
sobrepassa.

E é flagrante, perdulária,
noutros renascente.

Gratidão
que nem sabe
a quem deve ser grata.

Pelas aves nutrindo os filhos
de penugem e voo.

Pela lentidão escrupulosa
da tartaruga, igual à de Plutão.

Pela leveza materna do vento
transportando pólen.

Pelo calor humílimo
da joaninha sobre a nossa mão.

E por estar na terra
uma só vez, ao sol,
nada pedindo, nenhum segredo,
como um velho lobo-do-mar.

António Osório

LN

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