Europa social à pequinense
Com a globalização, os direitos dos trabalhadores chineses pouco avançaram, mas os dos trabalhadores europeus vão claramente a pique.
Nicolau Santos
A Europa está a caminho de ser a nova China. Não em matéria de crescimento económico, onde vamos continuar a vegetar em torno de taxas muito aquém das que se verificam no Império do Meio. Mas, sim, em matéria de legislação laboral. Ainda manteremos por algum tempo as semanas de trabalho em torno das 40 horas, cinco dias por semana. Ainda manteremos restrições ao trabalho ao fim de semana. Continuaremos a aceitar a existência de sindicatos e que os trabalhadores tenham direito à greve. E, claro, ofereceremos forte resistência a que seja possível voltar a utilizar trabalho infantil. Mas não nos iludamos. Ao contrário do que se esperava com a globalização, os direitos dos trabalhadores chineses pouco avançaram. Em contrapartida, os direitos dos trabalhadores europeus vão claramente a pique. E quem comanda a ofensiva contra o Estado social é a Comissão Europeia, que no dia 11 de janeiro aprovou um documento, 'Annual Growth Survey', onde estão expressas as linhas de força dessa orientação:
aumento dos impostos indiretos, enfraquecendo o caráter progressivo dos impostos; incentivo ao aumento dos horários de trabalho; elevar a idade de reforma e pressionar a privatização dos sistemas de pensões; enfraquecer a legislação que protege o emprego; reduzir os apoios diretos ao desemprego; e liberalizar o sector público.
Estas orientações, a serem concretizadas, reduzem claramente os direitos dos trabalhadores em favor do capital, dos escalões mais elevados de rendimentos e dos bónus pagos no sector financeiro; e atingem o equilíbrio do Estado social e o projeto europeu.
É a luz destas orientações e da santa aliança entre o FMI e a Comissão Europeia, que deve ser entendida a recente proposta do Governo aos parceiros sociais para: 1) Que sejam reduzidas as indemnizações a pagar aos trabalhadores despedidos, que passarão a ter por base 20 dias de salário contra os atuais 30; 2) A imposição de um teto máximo de 12 meses para essas indemnizações; e 3) a criação de um fundo para despedimentos.
Tomadas por si, estas propostas são inadmissíveis, ainda por cima no atual quadro económico, com inúmeras empresas a fechar as portas, deixando muitas vezes milhares de trabalhadores sem qualquer indemnização, e com fortes reduções dos apoios do Estado aos desempregados. Além de mais, esta é uma ofensiva neoliberal, cujos princípios estão na base da gravíssima crise que muitos países europeus vivem. E, finalmente, no caso português, não será por aqui que, de repente, as nossas empresas se tornam competitivas e a taxa de desemprego se reduz drasticamente.
Dito isto, contudo, não se pode ignorar a enorme pressão internacional a que as autoridades portuguesas têm vindo a ser sujeitas para flexibilizar o despedimento individual e para limitar as indemnizações (Portugal é o única país da União Europeia que não tem esta limitação). Por isso, é necessário mudar a legislação, sendo uma excelente ideia alinhá-la, no mínimo, com as leis espanholas. E é certamente necessário analisar se as alterações propostas em matéria de redução de indemnizações atingem muitas ou poucas pessoas. No cenário de injustiça que daqui decorre, pode ser que o Governo português consiga mostrar trabalho para o exterior - e não causar demasiados estragos internamente.
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LN
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