sexta-feira, 18 de junho de 2010

Fragmentos,Sublinhados de "O Ano da morte de Ricardo Reis"

"o beijo atingiu aquele limite em que já não se pode bastar a si mesmo, separemo-nos antes que a tensão acumulada nos faça passar ao estádio seguinte, o da explosão doutros beijos, precipitados, breves, ofegantes, em que a boca se não satisfaz com a boca, mas ela volta constantemente, quem de beijos tiver alguma experiência sabe que é assim"
"Senti o beijo como o mar deve sentir a onda"
"Creio que todo o homem ama sempre a mulher a quem está a beijar, ainda que seja por desespero"
"Quando se acredita em milagres, já não há nada a esperar da esperança"
"Afinal morremos, quando já não conseguimos suportar a violenta luz da vida"

"mas a solidão não é viver só, a solidão é não sermos capazes de fazer companhia a alguém ou a alguma coisa que está dentro de nós, a solidão não é uma árvore no meio de uma planície onde só ela esteja, é a distância entre a seiva profunda e a casca, entre a folha e a raíz"
"solitário estar onde nem nós próprios estamos"
"A solidão não tem nenhum limite, está em toda a parte"
"não me lembro de me ter sentido verdadeiramente útil, creio mesmo que é essa a primeira solidão, não nos sentirmos úteis, Ainda que os outros pensem ou nós os levemos a pensar o contrário"

"e ficou a observar-se atentamente, como um aprendiz de químico que misturou um ácido e uma base e agita o tubo de ensaio, não viu muito, é sempre assim se a imaginação não ajudar, o sal que daquilo resultou já era esperado, tantos são os milénios que andamos nisto de misturar sentimentos, ácidos e bases, homens e mulheres."

" apenas conservados na lembrança alguns fragmentos, não iguais, não complementares, não capazes de reconstituir o discurso inteiro, o deste lado, insista-se, por isso os sentimentos de ontem não se repetem nos sentimentos de hoje, ficaram pelo caminho, irrecuperáveis, pedaços do espelho partido, a memória"

"Defenda o que lhe resta, acreditar será o seu álibi,
Para quê,
Para manter a esperança, nada mais, chega-se a um ponto em que não há mais nada senão ela, é então que descobrimos que ainda temos tudo."
"e sorriu, eles sorriram também, são gestos e atitudes que fazem parte dos códigos de civilização, com a sua parte de hipocrisia, outra que é da necessidade, outra que é o disfarce da angústia."
"Virei, para não perder a esperança, Ainda estarei por aqui, se não a tiver perdido"

"se é o poeta que se finge de homem ou o homem que se finge de poeta"
"O seu caso Reis amigo, não tm remédio, você, simplesmente, finge-se, é fingimento de si mesmo"

Sublinhados feitos há muitos anos no Livro "O ano da morte de Ricardo Reis" de José Saramago.
No ano da sua morte, deixo aqui uma homenagem pequenina a um grande escritor português , Saramago.

Fica uma obra que é um marco e uma referência intemporal.

Homenagem também ao Ti Jacinto de Vale do Pereiro, que também desapareceu este mês. .





O mundo fica muito mais pobre sem pessoas que admiramos, mas no céu nasce sempre uma nova estrela que nos fica a iluminar nas noites de verão.

LN

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