Se o desonesto conhecesse as vantagens de ser honesto,
seria honesto ao menos por desonestidade.
Sócrates (filósofo grego)
À HONESTIDADE aconteceu algo de parecido. A ponto de se considerar que uma pessoa honesta “é parva” e “não sabe da poda”. Abundam os lugares-comuns que revelam que a honestidade não é um valor com muita saída. Quem defende a honestidade é considerado “ingénuo”. De alguém que perde tempo a escrever sobre a necessidade da honestidade na vida pública se dirá simplesmente que perde tempo com “sermões”. De um honesto se garante que nunca será rico nem irá muito longe na política. Um comerciante que não ”mete a unha” é palerma. Um corretor de bolsa que não usa informação privilegiada e não manipula os concorrentes é um mau profissional. Um político que, antes das eleições, não esconde as dificuldades, para só as revelar depois de ganhar, é um “tonto” e deveria mudar de profissão. Um empresário que nada oculta aos trabalhadores é um “samaritano” sem “killer instinct”. Um estudante que copia ou plagia só merece condenação se for descoberto. Aliás, se for “apanhado”, a complacência é de rigor.
TEMPOS HOUVE em que se tolerava ou compreendia a desonestidade por necessidade. Um ladrão que roubava pão merecia compaixão. Hoje, tolera-se a desonestidade de quem quer ganhar. Mais: recomenda-se a desonestidade para vencer na vida, na profissão, na política ou nos negócios. O financeiro que compra acções e empresas, que obtém empréstimos colossais, que joga e especula, pode utilizar os métodos que quiser, desde que vença. Os grupos económicos que usam métodos estranhos para ganhar concursos e empregam ou compram políticos são exemplos de boa gestão. A um político, pergunta-se se ganhou as eleições, se vai alto nas sondagens e se liquidou os seus adversários, mas ninguém se interessa pelos métodos utilizados. O empresário que mente aos trabalhadores, esconde informações e foge com bens e mercadorias tem perdão, pelo menos não é punido. O universitário que mente nos concursos apenas comete uma pequena falha ou nem sequer. O futebolista que engana o árbitro, magoa o adversário ou mete a mão à bola é um herói, desde que ganhe. O autarca que “faz obra” e enriquece ao mesmo tempo é um “fazedor”. O político que mente em benefício próprio limita-se a usar as ferramentas do ofício.
seria honesto ao menos por desonestidade.
Sócrates (filósofo grego)
À HONESTIDADE aconteceu algo de parecido. A ponto de se considerar que uma pessoa honesta “é parva” e “não sabe da poda”. Abundam os lugares-comuns que revelam que a honestidade não é um valor com muita saída. Quem defende a honestidade é considerado “ingénuo”. De alguém que perde tempo a escrever sobre a necessidade da honestidade na vida pública se dirá simplesmente que perde tempo com “sermões”. De um honesto se garante que nunca será rico nem irá muito longe na política. Um comerciante que não ”mete a unha” é palerma. Um corretor de bolsa que não usa informação privilegiada e não manipula os concorrentes é um mau profissional. Um político que, antes das eleições, não esconde as dificuldades, para só as revelar depois de ganhar, é um “tonto” e deveria mudar de profissão. Um empresário que nada oculta aos trabalhadores é um “samaritano” sem “killer instinct”. Um estudante que copia ou plagia só merece condenação se for descoberto. Aliás, se for “apanhado”, a complacência é de rigor.
TEMPOS HOUVE em que se tolerava ou compreendia a desonestidade por necessidade. Um ladrão que roubava pão merecia compaixão. Hoje, tolera-se a desonestidade de quem quer ganhar. Mais: recomenda-se a desonestidade para vencer na vida, na profissão, na política ou nos negócios. O financeiro que compra acções e empresas, que obtém empréstimos colossais, que joga e especula, pode utilizar os métodos que quiser, desde que vença. Os grupos económicos que usam métodos estranhos para ganhar concursos e empregam ou compram políticos são exemplos de boa gestão. A um político, pergunta-se se ganhou as eleições, se vai alto nas sondagens e se liquidou os seus adversários, mas ninguém se interessa pelos métodos utilizados. O empresário que mente aos trabalhadores, esconde informações e foge com bens e mercadorias tem perdão, pelo menos não é punido. O universitário que mente nos concursos apenas comete uma pequena falha ou nem sequer. O futebolista que engana o árbitro, magoa o adversário ou mete a mão à bola é um herói, desde que ganhe. O autarca que “faz obra” e enriquece ao mesmo tempo é um “fazedor”. O político que mente em benefício próprio limita-se a usar as ferramentas do ofício.
...
NENHUMA das acusações ou suspeitas acima referidas está provada. Mas os mais visados defendem-se mal. Governantes e magistrados têm o dever de ajudar a população a compreender, mas fazem-no mal ou não o fazem. Comentadores e especialistas desdobram-se em desculpas e justificações, invocando a lei e o mercado. Mas a verdade é que nem aquela nem este se deveriam sobrepor à honestidade. Mas, infelizmente, a honestidade e a lei não casam bem no nosso país. Aposto que muito do que referi, em particular relativamente à Caixa, é legal. Mas não tenho a certeza de que seja honesto. Aliás, com os exemplos recentes da distinção entre corrupção para fins lícitos e para fins ilícitos, percebe-se bem que a honestidade não está protegida pela lei. Tanto não exijo. Como não quero ser ingénuo nem parvo, não espero que a lei promova a honestidade ou a virtude. Mas creio ser razoável que a lei proíba, condene e castigue a desonestidade, o favor e a corrupção. É o que não temos.
«Retrato da Semana» - António Barreto - «Público» de 8 de Março de 2009
LN
NENHUMA das acusações ou suspeitas acima referidas está provada. Mas os mais visados defendem-se mal. Governantes e magistrados têm o dever de ajudar a população a compreender, mas fazem-no mal ou não o fazem. Comentadores e especialistas desdobram-se em desculpas e justificações, invocando a lei e o mercado. Mas a verdade é que nem aquela nem este se deveriam sobrepor à honestidade. Mas, infelizmente, a honestidade e a lei não casam bem no nosso país. Aposto que muito do que referi, em particular relativamente à Caixa, é legal. Mas não tenho a certeza de que seja honesto. Aliás, com os exemplos recentes da distinção entre corrupção para fins lícitos e para fins ilícitos, percebe-se bem que a honestidade não está protegida pela lei. Tanto não exijo. Como não quero ser ingénuo nem parvo, não espero que a lei promova a honestidade ou a virtude. Mas creio ser razoável que a lei proíba, condene e castigue a desonestidade, o favor e a corrupção. É o que não temos.
«Retrato da Semana» - António Barreto - «Público» de 8 de Março de 2009
LN
Sem comentários:
Enviar um comentário